Livros sob a influência

Livros que se desdobram, que criam associações com outros livros, que fazem dessa inevitabilidade, dessa condição natural bibliográfica, um programa. Livros que manifestam a influência em... Livros que se dissecam num conjunto de outros livros: pelo conceito, pela forma, pelas decisões editoriais, pela referência, pela ficção, pela citação. Que usam como esquema de «escrita» as lógicas da intertextualidade; que preferem notas à margem, notas de rodapé, indíces, listas bibliográficas, glossários, ao estatuto do texto principal. Livros que contrapõem o volume e estabilidade do livro, às inconstâncias da unidade, da página. Livros como palimpsestos tolerantes que impõem formas de re-escrita menos dramáticas, que não implicam apagar para re-escrever. Que re-escrevem como estratégia de continuidade, como outra forma de definição de sistemas de autoridade e valor. Livros que não são compilações de livros («os mais belos livros de... em...»), mas que re-escrevem outros livros e com este gesto decidido se constróem a partir das lógicas da apropriação, acumulação, condensação, superimposição.

Consumir livros leva a livros que consomem outros livros: uma integração estrutural. Se cada livro tendencialmente é uma espécie (com o seu ecossistema próprio) estes livros parecem traduzir cadeias alimentares, sistemas de referenciação que se consomem. Livros como forças culturais, que às vezes cooperam, outras vezes fazem braço de ferro numa competição pela existência e/ou sobrevivência. Uma outra via para a selecção natural das espécies/espécimes.
Texto/ensaio verbal-visual. Publicado em Livro do Meio (publicação própria) e Impossuível (editora Braço de Ferro), 2010.