Como reclamar a incompreensível dificuldade de comunicar com os mortos.


A Biblioteca Cosmos é uma empreitada editorial exemplar: em sete anos (1941-1948), e num contexto desfavorável, publicam-se 106 títulos em 145 volumes sobre temas da cultura geral, a preços acessíveis. A colecção representa a genuína ambição de produzir e disseminar o conhecimento, de democratizar o saber, onde cada livro é uma sala de aula, e cada leitor um potencial estudante sem mestre nem escola.

As biografias são exercícios recorrentes de individuação na história das ideias, e um género que revela o apetite voraz do colectivo em encontrar a excecionalidade individual, aqueles que são dotados e que ultrapassam a mediania. «Biografias» é também o título da 5.ª secção da Biblioteca Cosmos, e o mote que subjaz ao convite curatorial de COSMO/POLÍTICA que me foi endereçado pelas curadoras Sandra Vieira Jürgens e Paula Loura Baptista.

Mais do que as dos nomes enviados temporariamente para a posteridade, preferi outras narrativas — as das cadeias de transmissão e sobrevivência das ideias –, para depois escrutinar os métodos, as políticas, a economia. No caso da Biblioteca Cosmos, esta contranarrativa tem matéria. Encontrei-a no espólio das Edições Cosmos depositado nos arquivos do Museu do Neo-realismo, na forma de tipos de chumbo, zincogravuras, fichas dos assinantes. Estes objectos são os traços visíveis das entranhas de uma economia editorial, suportada pelo acesso aos meios, pela construção de uma comunidade de leitores e pela promoção de um diálogo de proximidade entre todos os envolvidos.

O Jornal Como reclamar a incompreensível dificuldade de comunicar com os mortos constitui-se como uma memória da investigação espoletada por estes objectos, em seis momentos: 1) Declaração de intenções; 2) As imagens invertidas do conhecimento, ou o «olho da história» da Cosmos; 3) O metal esquecido da economia da edição; 4) «Um problema se coloca, agora, entre o editor e o leitor: a cooperação.»; 5) «História de uma biblioteca viva»: para uma biografia das forças coletivas; 6) Pôr no papel uma economia da partilha.

Texto/ensaio. Publicado no âmbito da exposição Cosmo/Política #6, Museu do Neo-Realismo, 2020.

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